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2007/11/12

Siddhartha Gautama disse: tens de ser como água.

A vida escapa-se-me pelos dedos em gritos de agonia. O mundo escapa-se-me pelos dedos em flechas de solidão. A adolescência escapa-se-me pelos dedos em fulgor súbito e golos sôfregos de prazer.
O tempo é relativo, a paixão é relativa. O fogo é relativo, as queimaduras não o são. Porque tem de ser tão complicado viver assim, desta maneira ordinária e carrascona de ser?
Não há alma para tanto. O mundo é pouco, a vida não chega! Para a grandeza do Homem, não basta a omnipotência do Deus vivo. Para aplacar os medos irracionais, não acodem muralhas de betão e cimento; para amainar a sede de poder não é suficiente todo o cosmos.
Tudo se escapa pelos dedos. Como podemos saber quando alguém chora, quando alguém mente, quando alguém sonha, se em primeiro lugar não temos a certeza – sequer a ligeiríssima das noções – sobre os nossos próprios delírios quando decorrem?
O conhecimento é uma ilusão, é uma farsa artimanha articulada meticulosamente pelos estudiosos que tentam abrandar a dor patente que lateja no âmago do personalismo. As dúvidas são maiores que as palmas das mãos, e o conhecimento é água que se escapa pelos dedos.

Não há Razão, nem Consciência. É tudo fabricado, tudo artificial. Desde este texto, ao leitor do outro lado, à palavra digitada num rasgo de dor. Tudo se escapa pelos dedos, a Vida é fluida e inconstante. A vida é uma maré indomável, que nunca conseguiremos parar, o conhecimento é uma corrente imparável, incansável e incessante que nos atormenta por não a conseguirmos agarrar.
O movimento é uma ilusão óptica, a derradeira alegoria que magicámos um dia para tentar explicar. Não há palavras para o inexplicável, não há palavras para nada.

A vida escapa-se-me pelos dedos, em ondas de incertezas e arremessos de crueldade. Não podemos agarrar nada, tudo se nos escapa pelos dedos.

Francisca Soromenho, Verão'07
acompanhando a maior viagem de todas