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2008/01/30

Hesitas, e voltas, recuas e avanças: eu aguardo.

Desta vez com um beijo, com a brandura morna de quem se esgueira por uma porta entreaberta, suavemente foste-te entranhando até o teu sangue se confundir com o meu.
Um pedido, um susto, um arremesso brusco, turbulência maldita à qual me fui acostumando, e manter-me de pé só para poder cair…
Mas não podia ser só assim? Não podia ser a minha peripécia uma, e uma só, e tinhas tu também de me iludir? Dar-me todo o Mundo numa hesitação e fazeres por que percebesse que, sim, errei para sempre e não há voltar atrás?
Mata-me de uma vez! Não me faças sonhar mais contigo nem com o calor dos teus braços! Acaba, minha vida, com o meu tormento! Pois amei, vivi, sonhei e fui Feliz demais, um demais à minha condição humana, um demais ao corpo terreno ao qual estou presa!
Põe fim ao meu martírio, sou eu que te suplico, que ponhas um ponto final a esta morte lenta e agonizante em que me encontro, e deixa-me descansar! Vou aguentando, no murmúrio de uma oração solene e triste que me pesa na alma mais e mais, e amarro-me à incerteza plena entre um viver intenso, feliz, mas sofrido, e uma paz vazia mas reconfortante na qual me poderia esconder…
E intromete-se Deus, e a minha filosofia, e o prospecto do futuro e as memórias de um passado para não me deixar escolher! E apareces tu a dar alento, só tu para me sorrires e dizeres que te encontras alegre, e que me resta senão alimentar-me de ti?
Desgraçado, amor fero e eterno, que ora me dás esperanças ora me condenas, ora infundes vida ou ma ceifas, ritmada e constantemente, tirando-me o tapete debaixo dos meus pés. Tens sentido? Ou simplesmente te satisfazes ao me torturares, ou o flagelo é um teste à minha força, alma minha, e ver se duro o tempo todo sorrindo?
Dúvida, bruta dúvida que com mãos rudes me apertas o pescoço, mas só para me angustiar.

Preciso de uma eutanásia de mim, de ti, do impasse e do sofrimento em que me encontro… porque a dor é insuportável, e já me cansei de me arquejar.

2008/01/28

Lobisomens

Um deslindar curioso, que nunca tivera eu reparado em ti… e tu já me conhecias, tão bem. O teu respirar calmo, os teus comentários argutos, que em mim penetravam tal presa insuspeita… objecto de estudo prolongado, para ti, predador sábio e vivido que temerariamente voltavas à caçada. E entre cigarrilhas, vinho verde e luz dourada foste-te perdendo, caindo no abismo do qual nunca conseguiste retornar. A tua teia tornou-se minha.
Depois de tanta análise, de tanta preparação sensata para um acto rápido de ardor, acabas concluindo que ainda sou um enigma. Porque expectativas a curto prazo e prazeres mundanos depressa se fundiriam com ambições futuras, longas, demoradas, um eterno familiar que nunca perturbara os teus pensamentos, mas que agora te piscava o olho.
Não fui nem a primeira, nem serei a última, a ter olhado para ti, e ter-me deixado conquistar, com esses olhos cativantes que me vão despindo, num tom descarado e sôfrego. Não fui a primeira, nem serei a última a, receosa, dar-te um não, temendo por essa voracidade descontrolada. No entanto, sou a única, a única com a ciência uterina e inexpugnável que conseguiu enlouquecer-te de desejo, e deixar-te somente a fugaz memória de uma gargalhada. Fiz-te sofrer, e apaixonaste-te por essa dor.
Resta-te a representação sinestésica, amarga e injusta do conceito que eu sou, para que te martirize no silêncio. Mas não era o meu objectivo. Quedas-te, remoendo na noite solitária a tua campanha inacabada, pelo simples facto de sermos fruto da mesma colheita amarga – que nos distinguiu da maioria. O mesmo passado bruto que nos foi refinando, e os mesmos planos pessoais que fundaram o nosso Mundo. Ou ousas pensar que não sei? Arriscas apostar na crença falaciosa de que o meu encanto é uma arte, e ignorar que é nada mais que reflexo de ti?
Enganas-te, novamente. Porque com um esboço de um sorriso tímido, te desmascaraste para mim, e mostraste ser nada mais do que meu par.
Para os outros, continuas, envergando essa postura arrogante e abusadora, um escudo de ilusões másculas e adultas no qual te sentes protegido, camuflado num mar de testosterona que é para ti real. Debaixo dessa camada falsa de confiança, para além dessas garras impiedosas e de toda a força bestial, esconde-se um ser dócil que anseia por serenidade. Um Homem, de coração sensível e frágil, que colocou uma máscara para que nem ele próprio – tu – visses o teu lado terreno.
E insistes, sendo essa a tua magia: a dualidade fera – Homem. A disparidade que vai do animal selvagem, do predador que me traga sem ter me tocar… e do rosto miúdo que se perde com carinhos e mimos. Cujo desejo máximo é aninhar-se no calor confortável de outro corpo, e simplesmente repousar ao lado de quem ama. Injusta vida regida por aparências; como eu te percebo.
Tremes, recuas, finges aos olhos do Mundo que nada nunca aconteceu, e o teu ego fica inabalável. Será?
Novamente, quando rasgas a roupa de outro corpo, quando avidamente deglutes cada fracção de mim, só te dilaceras a ti mesmo. Perdendo-te em luxúria e volúpia miseráveis e infantis, só te corrompes a ti. E admiram-te, e aplaudem-te por essa sagacidade desmedida, e cada gesto aprovador do teu círculo de fachada se vai em ti enterrando.
Não falta que te veja chorar, porque sofro por tuas dores tomando-as como o que são: minhas. Como te conheço, meu igual, como te vou sentindo, e duramente me vais atormentando, com uma lembrança ondeante que oscila entre o lascivo e o terno…
Cruel fado, que trarias a inquietude aos grandes, de ansiar pela mansidão.

E nós dois, e nós dois...

2008/01/22

No que nos tornámos

O duro do teu olhar entristece e desanima-me, com esse sério contemplar que em mim repousa. Não vedes que este caminho, pleno de pedras afiadas e voltas sinuosas, foi só para nos ajudar? Nada se perdeu, tudo se ganhou, e em cada derrota lamentada apenas vencemos.

Porque te dói, agora, olhar para nós e ver no que nos tornámos? Porque sentes falta do outro dia em que era meramente um jogo, um recreio intenso e desmedido em que cegamente te perdias? Porque ao saíres de ti mesmo envergas um luto intransponível, para que todos saibam que doeu? É tão opróbrio o negro da tua forja?
Diz-me, do coração, se não te orgulhas das nossas gargalhadas marcadas com o rouco dos cigarros que fumámos sem pensar. Diz-me, de ti, do teu racional empedernido, que se de todas as cicatrizes não saíste mais douto. Atenta, que se ontem éramos muito, hoje pois somos muito mais.

A lascívia vã e infantil é meramente uma prisão para o ser humano que quer Ser, além da sua condição. O Homem transcende-se, e é mais que ele próprio, pois ao amar dignifica-se. Hoje, somos mais.
Somos amor de querer ao outro bem, somos amor de nos conhecermos em pleno. Somos amor de um caule imenso que vai deste cárcere terreno a Deus. Podemos já não ser de um brilho vítreo e cristalino, mas adensou-se vida em nós, e somos mais!
Não grites, não esperneies, não difames o cálice de que tragaste. Se o ontem foi muito bom e inesquecível, saboreia hoje este óptimo eterno, que por ti aguarda.

Crescemos em sonhos ultrapassados, crescemos em mares que atravessámos. Crescemos em dor, crescemos em revolta, crescemos na crua realidade do insucesso das nossas expectativas. Crescemos porque, por momentos fomos crianças, e porque soubemos outrora ser mais sábios que toda a idade. Finalmente, neste agora tardio, aprendemos a amar.

Tua, sempre tua,
Francisca Soromenho

2008/01/08

Sem título - PROMETO QUE VOLTO À PROSA...

Uma capa perfeita de verniz onde me posso esconder
Uma camada imaculada, linda, transparente
Onde sei que me vês, mas não me queres ver
E me deixas cativa a ti, enjaulada comigo, passando indiferente

Um universo só meu onde me recolho dos olhos do Mundo
E tu, sabendo, ficas indiferente.
Volto, e entro, para me afogar num poço de gritos surdos, sem fundo.
Só gostava de acabar com a frustração, só queria me sentir dormente...
Libertar-me das amarras do conformismo, e respirar "porque sim".
Sem motivos, nem causas, nem uma análise esbaforida e presistente,
Só respirar sem que ninguém me condenasse por ser para mim.
Viveria sem ti, sem os outros, sem este desejo ardente,
Respiraria flutuando, sozinha, outra vez no meu espaço santo
Não teria a agonia de me sentir desprezada e de te ver a ti ausente
e não haveria mais muros para criar esta prisão de mágoas que canto,
não existiria ninguém mais que me fizesse crer, assim, indiferente.
Só a brisa para me balouçar, e me envolver no seu manto...


Francisca Soromenho, 2008.01.07 @ bela da linha azul
acompanhando a maior viagem de todas